Friday, December 29, 2006

Ultimato

Quando fordes bem velha ao serão, à candela

Quando fordes bem velha ao serão, à candela
sentada ao pé do lume e a dobar e fiando,
cantando versos meus, direis maravilhando:
«celebrou-me Ronsard no tempo em que fui bela».

Nem criada tereis que acaso ouvindo ela
tal nova, em seus afãs já quase dormitando,
de meu nome soar não esperte, abençoando
vosso nome em louvor eterno se revela.

Em terra eu estarei, fantasma já sem osso,
entre mirtos e sombra a repousar num fosso;
vós sereis à lareira, idosa e encolhida,

chorando o meu amor e o vosso vão desdém.
Pois, crede-me, vivei sem ver se amanhã vem:
colhei desde hoje mesmo as rosas desta vida.

Ronsard, traduzido por Vasco Graça Moura

Imagino o Seth Cohen a seguir a deixa. Sob a forma de uns quadradinhos de banda desenhada, cuidadosamente elaborados, lançaria o ultimato à sua querida Summer.
Ela, apavorada com tão bem desenhadas rugas, correria para os seus braços.

É preciso ter lata.

Tuesday, December 26, 2006

Shall we dance?

Num daqueles livros que se guardam na estante e que de vez em quando resolvemos espreitar...
Bettina Gruber - Criaturas da noite, 1990
"Bettina Gruber criou frequentemente as suas obras fotográficas em conjunto com os seus trabalhos de vídeo, seleccionando algumas das melhores situações e isolando-as sob a forma de fotografias. A fotografia Criaturas da noite surgiu de um destes projectos de vídeo e mostra uma componente indispensável da sua arte: o seu cão Flicki."
in Fotografia do Século XX, Museum Ludwig de Colónia, colecção Taschen
P.s O scanner é caseiro...

Sunday, December 24, 2006

A melhor versão do Silent Night

Podia escrever muitas coisas sobre o Natal, a época, o paradigma do bom-tolerância-sorriso-vontade-dar-receber-agradecer.
Prefiro deixar-vos o link para uma versão do Silent Night, desta feita banda sonora de uma das cenas mais originais dessas comédias românticas - que do ponto de vista teórico-cinéfilo-intelectual podem não valer muito (ou não valer mesmo nada) - mas ora bolas, dá gozo ver.

http://www.youtube.com/watch?v=rA8q2iTTj14

Merry X-mas.

Thursday, December 21, 2006

O poeta, o professor e a aluna

"Para ser grande, sê inteiro: nada
Teu exagera ou exclui.
Sê todo em cada coisa. Põe quanto és
No mínimo que fazes.
Assim em cada lago a lua toda
Brilha, porque alta vive".

Ricardo Reis

"entusiamos pontuais são irrelevantes, para não dizer enganosos; o esforço lúcido, honesto, consciente e continuado não tem substituto"

in O Processo de Integração de Portugal nas Comunidades, Ernâni Lopes

Toma lá, que já almoçaste. Embrulha as queixinhas todas em papel pardo com um laço de ráfia bem apertadinho - que é para resistir a investidas. E não vale rasgar.

Wednesday, December 20, 2006

Diz o Conde

O Conde está quase a fazer anos - "nasceu no ano de 1826, em Penafiel, no dia de Natal". Dia, segundo o próprio, de "um parto singularmente feliz".
Por outras palavras, não se fez rogado e fez-se expulsar para o mundo. Que homem.

Diz ainda o Conde D'Abranhos - da família dos Noronhas, mas que entre nós é Alípio- sobre essas senhoras que se vendem por aí:

"As que vão pedir ao indolente abandono do lupanar o pão que deveriam obter das serenas fadigas do trabalho".

in O Conde D'Abranhos de Eça de Queiroz

Implacável;mal posso esperar para pegar no primo Basílio.

Tuesday, December 19, 2006

Dizem eles que amiga é um termo dúbio

Ontem as águas estavam serenas
Mantinham a distância certa
Éramos cúmplices apenas
Sem ter o coração alerta
Amiga era um sentimento
Sem fazer calor nem frio
Tudo entre nós era simples
Como as coisas em pousio
Foi qualquer gesto que fizeste
Qualquer coisa que disseste
Que mudou a situação
(...)
Carlos Tê
Rui Veloso
Costuma dizer o último, a falar sobre o primeiro: quem escreve assim não é gago!
Não substitui a das estrelas, que de resto também não cantou, mas cá para mim obedece às regras do curto claro e conciso, sem perder a graça.

Nunca mais é Maio


Deixem o cd de lado - «isto ao vivo deve ser um espectáculo» - porque desta vez é cá, ao vivo e a cores!


Estou como o Simba que em cima de girafas búfalos e elefantes cantava "I just can't wait to be king"! ( a ausência de vírgulas foi propositada)


Celebrate we will...



Sunday, December 17, 2006

Espírito Natalício

Os elementos fulcrais: a multidão - nos centros comerciais, na baixa, na ponte, nas estradas; o Pai Natal - em todo o lado (e de idades várias); o circo chen, ou outro qualquer.
E todos estes juntos, hoje, no estádio do sporting: a casa cheia, o sr árbitro vestido a rigor, e uma segunda parte de ir às lágrimas.
E mais! Pelo meio, uma troca de palavras e ameaças extremamente elegante e amigável entre dois indivíduos, na bancada central.
No intervalo, três galinhas entraram em campo para fazerem publicidade a um espectáculo, e nem uma palma levaram, coitaditas.
Disseram-me, no fim, que valeu o resultado. Eu cá acho que o Pai Natal verde e a sua vespa trajada a rigor, qual mascote do sporting (com o símbolo e tudo!), é que teve graça.
Boas entradas, sr Ricardo.

Tuesday, December 12, 2006

(rever o conceito de) Cidade Luz
















Conselho do Chico

Ouça um bom conselho
Que eu lhe dou de graça
Inútil dormir que a dor não passa
Espere sentado
Ou você se cansa
Está provado, quem espera nunca alcança
Chico Buarque
Pode nem ser sempre verdade, mas pica.

Sunday, December 10, 2006

Técnicas de engate



Jonathan (Louis Garrel) no filme Dans Paris, diz para uma rapariga que nunca viu na vida, e que observa a montra de uma loja:

- Embrassez-moi, c'est une question de vie ou de mort.

Por cá, anda por aí uma nova técnica:

- Tens Hi5?

Saturday, December 9, 2006

The wind that shakes the barley, Ken Loach


Foi escolhido directamente da prateleira do blockbuster, sem a bagagem de críticas ou comentários que mo fizessem escolher. Sendo assim, as expectativas não existiam, e talvez por isso tenha gostado tanto do filme.
A acção inicia-se na Irlanda de 1920, no contexto dos primeiros movimentos do IRA pela independência face à Inglaterra. É-nos dada a perspectiva de uma localidade a sul da Irlanda, onde um pequeno mundo de personagens oferece-nos um ponto de vista menos histórico-factual, e mais humano e –muitas vezes- dramático.
Damien (Cillian Murphy), filho pródigo que pretende exercer medicina em Londres, desiste de partir quando assiste ao assassínio brutal e injustificado de um amigo, por parte das forças inglesas. Junta-se ao irmão Teddy (Padric Delaney)- que já o havia incentivado a ficar - e reúnem uma guerrilha para combater o controlo inglês.
A guerrilha – formada pelos trabalhadores locais, amigos entre si – é rudimentar nos métodos, nos esconderijos; ao mesmo tempo, são poucos mas fortes, e criativos na táctica contra a armada inglesa. Estou-me a lembrar de uma cena na estrada, mas não a descrevo, porque já sei que depois sou acusada de contar tudo.
Pelo meio, há cenas de violência explícita, incomodativa até aos mais corajosos. A lealdade para com “a causa” é levada até ao extremo, e mais uma vez surge-nos uma cena especial.
Com o armistício e o primeiro acordo conseguido com o governo britânico, acaba uma luta, e começa outra.
A notícia chega à localidade num grande écran, num pequeno filme projectado numa sala de cinema. A independência não era para todos: a zona Norte ficaria sob o domínio inglês. E aqui começa a discórdia entre dois lados, e entre dois irmãos: uma guerra civil e outra familiar.
Um quer a paz a todo o custo, e acredita que a independência total será conseguida mais tarde. Outro recusa-se a “vender a causa”, e cria um movimento de rebeldes.
O título é também o de uma música, que está presente no filme.
E mais não conto.

Friday, December 8, 2006

No metro

Algures durante a semana, num dia em que falhei a boleia da manhã. 9H30, estação de metro do rato. Já passei pelas máquinas, estou a descer as escadas na direcção Campo Grande/Odivelas, com o portátil a tiracolo.
Sou interrompida por uma voz feminina, já com alguma experiência:
- Menina, olhe que tem os atacadores dos sapatos desapertados...

Se fosse outra pessoa, tinha-lhe respondido -é costume!
Mas aquela senhora não me conhecia - levou com um obrigado, meio atrapalhado.

Thursday, December 7, 2006

Nota (roubada) sobre Erasmus

Aos vizinhos de furio camillo...
"O que se vive é irrepetível, e é irrepetível porque, uma vez vivido, não é possível voltar atrás. Se desse para viver sempre da mesma forma que se vive em Erasmus, de ilusão passaria a realidade, e com isso perder-se-ia grande parte da sua magia."
in Erasmus de Salónica, de António Paisana
...e a quem me deu o livro, já agora.

Wednesday, December 6, 2006

O Primeiro

Dizem que quando chove é porque alguém – lá em cima – está triste. Talvez com alguma razão, mas depende da chuva.
Também é costume associar-se um dia chuvoso (apesar dos evidentes benefícios para a agricultura) a uma grande chatice.
Não é sempre.
Quando a chuva é forte, dura, e com a ajuda do vento torna impossível a missão do guarda-chuva, não me parece que alguém queira dizer “estou triste” - quanto muito, estaria de mau humor. E depois ficamos todos.
Mas quando a chuva é miudinha, daquela que molha mas quase não se sente, que se ouve lá longe mas a quem se reconhece a voz, o caso é outro.
E naquela noite - quando também ela não podia chorar em frente de outros - a chuva fez-lhe companhia.

Porque me devolveu a vontade de escrever.